quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A Criança, a médica e os nossos monstros !

Olá pessoal. Andamos com um espaço de tempo entre as publicações por falta de tempo mesmo e não por falta de assunto. Volto agora para continuar nossos diálogos através das letras.


Precisamente no mês de junho passamos por uma experiência diferente em nossas vidas. Como em todo tipo de situação é possível aprender e acredito que aprendemos muito. Em abril nosso filho José Renato teve uma infecção de garganta das várias que ele vem enfrentando desde pequeno. Como em todas as anteriores, o tal antibiótico foi receitado. Ao findar do tratamento (oito dias tomando a droga) nada da famigerada dor ir embora. O diagnóstico foi trocar de antibiótico, mas daí não há estomago que aguente. O resultado da brincadeira foi tomar o novo antibiótico através da veia durante novos oito dias. Vendo todo o quadro e fazendo um balanço do sofrimento que ele vinha passando desde bebezinho, decidimos que era chegada a hora de submetê-lo a uma cirurgia para retirada de amigdalas e adenoide. Diante de todo o quadro anterior e os sofrimentos de respiração noturna, tomamos a decisão. Procuramos a médica Dra Carmem (falarei um pouco mais dela a seguir) para iniciar o processo. Na primeira consulta, conversamos e falamos do caso e num exame detalhado realmente a cirurgia era a melhor situação. Nossa preocupação era aquela de pais de filho único indo para uma cirurgia. Tensão, preocupação. Por mais simples que possa ser a cirurgia, não deixa de ter riscos devido à anestesia geral, recuperação etc.

Aparecem a partir daí, dois personagens que nos fizeram aprender muito com a situação. O primeiro personagem é a criança com toda a festa e olhar diferente do mundo. A simples notícia de ter de tomar sorvete e milk-shake para se curar foi o suficiente para o carinha ficar muito feliz. Ele não via a hora de chegar a cirurgia. Uma confiança fantástica, afinal, segundo ele, "eu não vou ver nada mesmo e depois, milk-shake "! Por mais que a criança ainda não entenda de todos os riscos que citei acima, a visão do mundo é muito diferente. Tem um olhar positivo sobre tudo e qualquer problema é incapaz de transpor seu escudo protetor contra a preocupação. Chegado o dia da cirurgia, eu e os demais ao meu redor numa pilha de nervos e o carinha dando risada. Colocou a camisola cirúrgica e foi uma farra, dando risada daquela situação ridícula, onde aquela tradicional abertura de camisolas de hospital, expõem-nos ao ridículo. Qualquer adulto perderia o humor com isto, mas uma criança dá risada do ridículo e como ele mesmo disse "meu bumbum está de fora". Até hoje é nítido em minha memória o carinha deitado na maca e se encaminhando para a sala de cirurgia. Estava coberto e só aparecia o rosto que guardava um sorriso gigantesco de quem estava se divertindo com a situação inusitada. Chega a hora da separação, onde ele tem de seguir sozinho pelo corredor do hospital. Beijos e o olhar consolador de alegria do carinha que imaginava mas não sabia o que lhe esperava. Ali, ele já estava anestesiado e protegido pela autoconfiança, coisa que nos falta em diversas situações da vida. Sim, uma criança ensina muito mais do que aprende.

Nem preciso falar que foram as três horas mais intermináveis do planeta. Até nisto tem o lado positivo; dá para medir o quanto o amor pode ser gigantesco a ponto de doer mais que fisicamente. Senti ali a dor do amor de quem daria tudo para trocar de lugar.

A cirurgia correu de forma maravilhosa. A recuperação foi um pouco difícil nos dias que se seguiram, mas tão logo as dores deram uma trégua o carinha já estava rindo da vida novamente. A vida realmente para uma criança tem o sabor de um milk-shake.

A segunda personagem deste acontecimento chama-se Dra.Carmem. Com ela verifiquei que as escolhas sempre estão em nossas mãos. Fazia tempo que não sabia o que era ser tratado como gente diante de um médico. Evidente que ir ao médico não é algo prazeroso, pois só de ir já indica que algo está errado, porém a maioria deles torna a experiência 100% pior do que é. Consultório com filas intermináveis, uma agenda nunca estabelecida com precisão, com margem de erro nos horários mostrando um desrespeito total com o ser humano; somando-se a isto, geralmente na maioria dos consultórios, encontramos secretárias nem sempre simpáticas, não vemos e nem temos a disposição sequer um café ou coisa parecida para compensar o desrespeito do horário. Para coroar toda a falta de cuidado, ele, o próprio médico, dá o toque final utilizando-se da falta de explicação adequada e em alguns casos demonstrando nitidamente a prepotência dos que pensam estar muito acima daquele que está a sua frente, não passando um minuto de firmeza sobre seus diagnósticos.

Estando acostumado a todos estes fatores é que seguimos até o consultório de Dra.Carmem para a consulta de José Renato. Até ser atendido as coisas estavam meio que iguais e ainda estava meio que descrente quanto ao atendimento que nos seria prestado ao atravessar a porta. Quando enfim fomos atendidos, senti a diferença logo no início. Um tino profissional para lidar com o ser humano como ninguém. De cara, estabeleceu-se uma empatia entre médico e paciente e entre todos nós naquela sala. Não deixou de explicar nada, dos riscos inclusive. Conversou conosco como se fossemos velhos conhecidos. Conseguiu perceber nossa aflição com relação a submeter o filho a uma cirurgia e com maestria, tratou toda a situação sem esconder nada, mas passando uma confiança que nos encorajou a seguir em frente. O atraso que ocorreu para sermos atendidos foi diferente, pois ali tinha uma médica que dava atenção aos seus consultados, o que deveria ser regra e não exceção. Fizemos ali realmente uma consulta médica. Marcamos os exames e voltamos a nos encontrar duas semanas depois. Mais uma vez, um atendimento de primeiro mundo por parte dela, continuando a nos encorajar, estabelecendo uma amizade com o José Renato, o que nos deixava tranquilos a seguir adiante. No dia da cirurgia, a mesma atenção. Quando saiu da sala de cirurgia, nos procurou e nos tranquilizou, falando sobre a cirurgia e os procedimentos a seguir dali em diante. Deixou seu celular e adiantou que qualquer problema estaria a disposição.

Dra. Carmem nitidamente gosta do que faz e faz bem feito. É uma daquelas pessoas que estão dentro daquele índice dos 5% que fazem a diferença no que fazem. O meu plano de saúde paga a mesma coisa a ela e aos outros médicos; ela tem uma rotina de trabalho extensa como os outros; vive sob tensão em processos cirúrgicos que exige precisão assim como os outros médicos. Então o que diferencia ela dos outros ?

Talvez seja que a Dra.Carmem tem a mesma visão de mundo que o José Renato, ou seja, continua a ver o mundo com o olhar da criança, aquele olhar que permite tomar atitude que transforma tudo que está ao seu redor. Para Dra. Carmem e para o José Renato a vida não lhes deve nada e tem o sabor de um MILK-SHAKE.

terça-feira, 17 de maio de 2011

VOLUNTÁRIOS

O tema escolhido para este texto é dos mais importantes. Falar do que significa realizar um trabalho voluntário talvez não caiba em nenhum editor de textos já inventado pela tecnologia. Mas ao contrário do que se pensa, o texto será curto e certeiro, pois ele precisa se parecer com o trabalho voluntário: ser efetivo.

Doação é o que o ser humano tem de melhor. Em um final de semana, participamos de um destes trabalhos voluntários que visa fortalecer a família dentro da sociedade. Eu e minha esposa coordenamos uma equipe maravilhosa composta por vinte e duas pessoas de alto calibre no que se refere a visão de mundo, a estar disponível para realizar aquilo em que acreditam. Encontramos pessoas maravilhosas que realizaram um trabalho igualmente maravilhoso. Todos nós acreditávamos naquilo que estávamos fazendo e através de uma entrega total, colhemos os frutos, melhoramos um pouquinho mais o mundo onde vivemos.

O que fizemos, onde trabalhamos e quem são estas pessoas não vou poder divulgar aqui, pois faz parte da natureza deste trabalho. A única coisa que posso indicar é que se você ainda não participou de nenhum trabalho voluntário, procure um que seja de sua vocação e realize com toda sua energia. Irá ver o quanto de satisfação isto lhe trará. Nos lugares onde tais trabalhos são realizados haverá uma placa sempre com o mesmo dizer mesmo ela não estando lá fisicamente: HÁ VAGAS. Igrejas, ONGs, associações de bairros, escolas, praticam em algum momento serviços desta natureza. Adentre por estas portas e descubra um mundo diferente.

Apesar das mazelas do ser humano, tem muitas pessoas querendo mudar o mundo. E o voluntariado é uma das formas de efetivar esta mudança. Fica aqui a minha admiração por todos aqueles que de alguma maneira contribuem para transformar o mundo através do serviço voluntariado, empregando o amor em um de seus melhores formatos.

Obs: Sonhar não custa nada não é ? E se os cargos políticos municipais (principalmente o de vereadores) fossem de natureza voluntária e não remunerados ? Sobraria alguém ? Teríamos melhores nomes ? O aceite do trabalho voluntário se dá através do coração e significa servir. Só por este motivo talvez já melhorasse algo e teríamos pessoas comprometidas não com a recuperação do que se gastou em campanhas e outras coisas mais. Para pensar!!!

terça-feira, 22 de março de 2011

40 do primeiro tempo.

    Na iminência de adentrar para o seleto time dos que já completaram 40 anos no próximo dia 27 de março, desafio-me a falar um pouco disto nas próximas linhas. O que será que pensa o homem que completará 40 anos ? Ia fazer esta pergunta colocando o artigo indefinido "um" homem, mas seria muita pretensão querer representar toda a classe aqui, visto que cada um pensa de maneira diferente. Tentei entrar na minha cabeça para fazer uma auto-entrevista. Fazendo uma analogia com um jogo de futebol, como o título do texto sugere, quando se chega aos 40 minutos de um primeiro tempo, o jogo está quase acabando e aí os times descerão ao vestiário para recuperar as forças e voltar para o segundo tempo seja para manter ou ampliar o placar quando se está ganhando, ou correr um pouco mais quando se está perdendo. No futebol o placar é formado pelo gol marcado ou sofrido. Na vida, a grande incógnita é saber definir muito bem o que forma o seu placar, inclusive para posteriormente poder saber se você está ganhando, empatando ou perdendo.

    Pensando um pouco mais a respeito, o meu placar é formado por diversos fatores dos quais comecei a fazer uma análise. Cheguei a conclusões e defini o que hoje é muito caro a mim, que eu denomino de elementos essenciais, que são compostos por fatores tais como família, amigos, saúde, espiritualidade e cultura. E nestes termos estou ganhando de goleada.

Família: Talvez seja uma vocação formar uma família. Coloco este item no topo, pois não tem como ser diferente. Tudo passa, o concreto fica, mas sua família te dá àquilo que em nenhum lugar do universo irá conseguir. É este ambiente que lhe proporciona grandes alegrias e grandes tristezas. Minha família é maravilhosa e contém os mesmos elementos que todas as outras: diferenças, abraços, beijos, desentendimentos, solidariedade, falhas, acertos, amor, problemas, decepções, união, apoio, exigências, apego, carinho, consenso, contrassenso, tudo isto tanto para mais quanto para menos em determinadas situações. Isto porque todos são pessoas como eu. Qual família é diferente disto ? O fato é que na essência todo mundo é bom e eu sinto isto quase que fisicamente. Independente dos fatores citados anteriormente estarem no mais ou no menos, amo todos eles.

Amigos: Fato que não posso reclamar. Tenho muitos e aqui desmistifico que qualidade significa redução da quantidade. Neste item, no meu caso, não existe regra de proporção. Tenho diversos amigos, muitos amigos mesmo. Dizem que nas situações de aperto é que saberemos quais são eles. Talvez, mas isto pouco importa agora. O fato é que tenho retirado de todas as pessoas que me cercam belos exemplos de seres humanos. E a gente sente quando as pessoas gostam da gente, que querem o nosso bem. Isto me dá uma energia muito boa na vida, sinal que estou seguindo um bom caminho. É o meu termômetro. Também aprendi que não é uma fagulha de comportamento de qualquer destas pessoas que a destronam do posto de amigos. Queremos as pessoas do jeito ideal para nós e aí o crivo fica afiado para definir quem é ou não passível de ser considerado amigo. É evidente também que existem pessoas muito difíceis de conviver, mas o problema é com elas mesmas, pela rigidez cognitiva em demasia. Mas os amigos são os pilares e para ter ou ser amigo, é preciso apenas abrir o coração. Não pode ter exigência. Muitos dos que não encontro há tempos, dedico ao menos uma oração como um modo de mantê-los por perto. Não me atreveria a escrever o nome de todos estes amigos aqui, visto que não me perdoaria em esquecer algum nome desta minha enorme lista. O fato é que muito provavelmente você que está lendo este texto é uma destas pessoas especiais das quais cito.

Cultura: Deus me presenteou com um dom de apreciar as coisas boas. Independente dos Big brother's ganharem espaços, das músicas ridículas tocarem ininterruptamente nas rádios (o que virou a minha amada Rádio Aparecida é inacreditável), dos programas televisivos cada vez mais ridículos, continuo atraído por coisas boas e não somente para poder bradar aos quatro cantos que não assisto e depois em casa assistir a todos estes programas. Falo com propriedade, pois me considero iluminado por não me interessar por nenhuma destas porcarias citadas anteriormente pelo simples fato de não gostar mesmo. Que sorte a minha. Continuo apreciando o que o homem produz de melhor seja na música, no cinema, na literatura, nas artes em geral. Este ponto é muito importante para a vida. Saber apreciar, pesquisar aquilo que nem sempre é divulgado. Ter aprendido música aguçou esta sensibilidade e como conversava por estes dias com um grande amigo, isto muda o seu jeito de viver, de agir, a meu ver para muito melhor. Saber tirar som da imaginação, de um instrumento, nos torna mais gente, mais forte no lado humano. É uma forte ferramenta para lidar com circunstâncias da vida e um tipo de inteligência das mais importantes, classificada há anos atrás como inteligência emocional.

Espiritual: Acredito que consegui traçar uma linha bem clara sobre razão e espiritualidade. Uma das coisas que adoro é a filosofia. Em minha opinião, existe uma linha limítrofe a respeito da filosofia e da religião. Quem não sabe exatamente onde termina uma e começa a outra, tem grande chance de viver uma vida muito vazia. A religião quando usada sabiamente e quando se consegue entender exatamente qual o seu sentido, abre muitas possibilidades de crescimento como pessoa. A filosofia idem. Como pode o casamento entre filosofia e religião ? Acredito ser perfeitamente viável, desde que se tenha equilíbrio no discernimento das duas coisas. E comigo tem sido assim. Acho que estou encontrando o ponto certo. Quem se radicaliza em um dos dois pontos, torna-se em algum momento vazio, pois as respostas consistem justamente no casamento das duas coisas na minha humilde opinião. A espiritualidade engrandece o homem tanto quanto o conhecimento filosófico.

Saúde: Item fundamental para ter o resto das coisas aí de cima. Não tenho do que reclamar. Até hoje, tudo vai muito bem e sou muito grato a Deus por isto. Quem não tem um problema ou outro ? Mas acho que o tamanho destes problemas torna injustificável a sua narrativa diante do todo.

    O jogo tem caminhado muito bem para o meu lado. O fato é que às vezes outros fatores entram na frente e distorcem tudo isto. É preciso estar com estes indicadores muito claros na nossa cabeça, pois do contrário, a busca frenética pelos dias atuais nos confundem e somos capazes em certos momentos de pensar que a vida não anda boa. Mas é lógico que a vida que chega aos 40 também traz questionamentos e dúvidas.
Tomando um chopp com um amigo que está morando em outro país deparei-me com uma brincadeira feita por ele que também é deste quadro de idade; disse-me "olha rapaz, você já tem mais passado do que futuro !" Devolvi a brincadeira dizendo "Vou enterrar todos vocês, eu prometo !" Silêncio. Troca de olhares e gargalhadas a seguir. Brincamos com o fato de estarmos virando os 40, numa boa, sem trauma. Quando alguém pergunta minha idade, eu respondo sem dor, não tenho crise quanto a isto. O fato é que no futebol onde jogo bola hoje sou o mais velho (ainda dou trabalho para os meninos mais novos); na empresa onde trabalho os meninos mais novos começam a me chamar de senhor. Evidente quando se fala em idade, fazemos uma correlação em algum lugar de nosso inconsciente com a morte por estarmos nos aproximando cada vez mais dela mesmo que ainda esteja distante. Isto permeia o inconsciente coletivo também. Em algum lugar em nossos pensamentos, tem uma ampulheta virada e a areia está caindo. José Saramago brinca em "As intermitências da Morte" retirando a entidade de nossas vidas e é interessante perceber o que acontece, se a vida melhora ou piora. O primeiro ponto é estar bem resolvido quanto a este assunto e o fato é que ninguém consegue por mais que pronuncie que sim. E o homem de 40 anos que sou prefere esquecer isto por enquanto, prometendo retornar a este assunto um pouco mais a frente no tempo, quando estiver melhor resolvido.

    É o homem de 40. Alguns chamam os questionamentos que temos em certa idade como crise de meia idade. Eu mudaria isto, talvez todos nós passamos por uma segunda adolescência. Muito mais do que as transformações físicas (cabelos brancos ou a falta de cabelos de qualquer cor) um homem de quarenta anos enfrenta sim uma nova adolescência, porém, com uma maturidade muito maior para diferenciar exatamente as inquietações que realmente merecem ser pontuadas. Lá na primeira, uma espinha incomoda tanto quanto a dificuldade de se escolher um futuro. Na segunda, o que incomoda são fatores que batem de frente com aquilo que você acredita e que nesta altura da vida está muito claro e consolidado na personalidade. E daí, tal qual fazemos na primeira adolescência, precisamos fazer diversas escolhas, talvez mais duras e necessárias. Talvez segunda adolescência seja mesmo o nome apropriado, pois pensava que todas as dúvidas estariam resolvidas com a maturidade. Que nada, algumas foram resolvidas, outras surgem. Às vezes a gente vive uma situação meio que parecida com Sócrates, o filósofo que tanto nos ensinou: "só sei que nada sei". Tenho esta convicção principalmente depois que vejo que atualmente a pessoa que mais me ensina os conceitos da vida tem apenas oito anos de idade e chama-se José Renato. Só sei que nada sei, ou se preferir, só sei que tenho muito ainda a aprender. Se o que move o ser humano são as perguntas e não as respostas, ainda tenho muito a caminhar. Lembro-me de ter conversado com Dona Raimunda, avó do Lô Borges, quando estava completando seus 100 anos de idade, abordando sobre o segredo desta longevidade e ela me respondeu o seguinte: esqueça logo seus problemas, reze e faça palavras cruzadas. Talvez seja uma boa receita, pois a dona do conselho foi-se embora aos 103 anos, com pequenos problemas comuns do desgaste da carcaça física, mas a mente, completamente saudável.

    Apesar de todas estas dúvidas que ainda vão perdurar por tempos, na trajetória dos 40, começamos a buscar e iniciamos uma compreensão de como queremos marcar nossa passagem por aqui nesta vida, qual a nossa missão aqui nesta passagem e começamos a querer alinhar cada uma de nossas atitudes a esta descoberta. Como seremos lembrados, depende realmente das atitudes do agora. Começo a escrever hoje o meu passado e tomara que ele seja bem escrito, pois muito lá na frente, ele será o livro de cabeceira de todas as noites.

    A todos envolvidos direta ou indiretamente à minha vida nestes 40 anos o meu muito obrigado por tornar minha existência significativa. O blogueiro dá a liberdade de desejar a si mesmo muitos anos de vida e dizer a todos que a vida é maravilhosa. Que ela comece todos os segundos, todos os dias, em qualquer idade. Sou neste momento o maior admirador da frase "A vida começa aos 40".

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Férias

    Depois de umas merecidas e ótimas férias estou de volta aqui neste espaço dedicado a reflexões do cotidiano e o tema não poderia ser outro a não ser falar sobre férias. Não são apenas os trajes que ficam mais leves durante este período, mas também as pessoas ficam mais abertas, disponíveis e com semblante de gente. Isto é fato comprovado principalmente quando a gente viaja e encontra pessoas de diversos outros lugares. E nestas férias tivemos a oportunidade de conhecer pessoas maravilhosas, que tornaram nossos dias especiais, pelo simples fatos delas estarem abertas a interagir, a querer formar uma espécie de família "postiça" em um lugar neutro. Foi assim que nos sentimos nestes dias em que convivemos juntos. Tínhamos todos os ingredientes para que pudéssemos passar dias felizes pois a interação ocorreu entre pessoas de gerações diferentes, profissões diferentes, classes sociais diferentes, de origens diversas mas que tinham em comum o gosto pelo conviver. Reunidos ali no mesmo "balaio", tínhamos músicos, psicóloga, arte terapeuta, professores, estudantes; brasileiros e cubanos; paulistas, mineiros e cariocas; crianças, jovens, adultos e experientes. Estabelecemos por poucos dias o que gostaríamos que acontecesse em nossas vidas em todos os momentos, onde os pequenos prazeres tais como um café, um almoço, uma pizza ou um sorvete degustados literalmente no coletivo e acompanhados de uma boa conversa se tornavam algo completamente especial. Se a bolsa de valores estava em alta ou em baixa, pouco interessava.

Em um dos dias que por ali permanecemos, nossos filhos, por iniciativa própria se reuniram e decidiram comer uma pizza no restaurante do hotel. Olhando aquela cena, minha amiga Simone, mãe de duas meninas absolutamente especiais, professou uma frase feita: "'É isto que a gente vai levar da vida ". Frase feita sim, mas indico que nunca vi uma frase feita ser dita num momento tão apropriado e com justificativa tão a altura. Além disto, a frase saiu do coração e não da boca, o que complementou ainda mais o seu efeito.

    As conversas foram realmente o ápice daqueles dias. E conversas sobre assuntos dos mais variados onde falamos da vida. E como é importante encontrar pessoas que estejam com o semblante de gente (repetindo) para que possamos ter a oportunidade de comprovar que a vida não é este posso de tensão a que nos submetemos todos os dias. Com este espírito totalmente aberto, é possível compartilhar, aprender.

Falo sim em aprender. Com meu amigo Anselmo, músico profissional que toca piano nos bares do Rio de Janeiro, em nossas longas conversas (quando músico encontra músico a coisa se estende como vocês nem possam imaginar) pude verificar que o conceito de felicidade é realmente subjetivo. Em nossas conversas, ele relatou que os freqüentadores dos restaurantes onde ele toca são médicos, executivos, advogados tendo como característica um elevado padrão financeiro. Não é que vários destes chegam a beira do piano de caldas e professam a seguinte frase ao músico: "Se eu pudesse trocaria de lugar com você !" Pessoas que ganham em um mês o que nós talvez levaremos anos para igualar. Está aí a grande dicotomia entre o mundo real e o imaginário. É certo que todos tem a visão lúdica da profissão músico, mas tem outras coisas por trás desta frase. Anselmo também é bem sucedido e talvez muito mais realizado do que muita gente que passa por ali. Talvez aos nossos olhos isto pareça impossível, mas basta conversar com ele para comprovar o fato.

Com minha amiga Simone, a pessoa que congrega, pude aprender que os resultados de nossas convicções se trabalhadas sem desistência irão refletir diretamente em nossos filhos. A arte terapeuta, esposa de nosso amigo Vagner que infelizmente não pode estar conosco nestes dias, apresenta para o mundo duas filhas Ana Luiza e Ana Beatriz, duas jovens que já estão fazendo a diferença para os que convivem com elas. Conversando com Simone é possível saber porque as Anas são especiais. Simone é capaz sem fazer esforço de nos fazer sentir de casa, como velhos conhecidos (e acho até que já somos mesmo !). Em nossas conversas, suas colocações a respeito daquilo que pensa da vida principalmente nos aspectos familiares é de uma precisão quase que cirúrgica de tão certeira na habilidade de unir palavras aos seus pensamentos. Além disto, Simone nos presenteou com sua simpatia, nos jantares do hotel, sempre agregando a turma.

Com Ana Luiza e Ana Beatriz, respectivamente com 13 e 14 anos pude ver o quanto a educação vinda de berço faz a diferença no ser humano. As duas foram capazes de nutrir uma amizade por José Renato de 8 anos, coisa que talvez outras adolescentes nesta idade sequer cogitariam em levar adiante. Não só por isto, mas pela fina educação que é notória, aprendo que o período de adolescência pode ser algo mais divertido e sensato do que vemos por aí.

Com os recreadores Maurício e Lilo e com o chef do Hotel, Paulo, verifico o quanto é importante ser competente naquilo que se faz. Maurício e Lilo lidam com as crianças com maestria a ponto de nossos filhos adorarem estar com eles e nos deixando tranqüilos com relação a isto. Além disto, nos divertem também em nossas saídas. Agora, se o Barack Obama experimentasse os pratos do chef Paulo, ele iria falar "This is the man !" É o cara em que tudo onde ele coloca a mão vira "ouro". Acredito que se eu pegar um ovo mal feito por mim e pedir para o cara dar um jeito, ele faz virar um prato inesquecível. A gente passa diversos dias sem que o cara faça uma coisa sequer que não agrade ao paladar. Tive na cozinha e falei a ele que está proibido de se aposentar enquanto eu viver.

Com Luben e Issara, nossos amigos Cubanos pude ter uma aula sobre Cuba de quem viveu lá dentro. É impressionante como a visão de um ser humano pode piorar tanto assim a vida das pessoas. É impressionante como as fronteiras imaginárias podem limitar a liberdade e a vida de tantos. Como uma ideologia pode ser utilizada para benefício de poucos e como intelectuais do mal podem ser comprados a apoiar o que é ruim em detrimento dos intelectuais do bem que são presos e torturados pelo simples fato de expressarem o que os olhos vêem. Como a rigidez por parte dos governantes do lado de lá (Cuba) e do lado mais de lá (USA) pioram a vida das pessoas. Fronteiras imaginárias, resquícios de uma guerra imaginária. Além disto, ser humano é gente em qualquer lugar, seja em Cuba, China, Arzebaijão. Será tão difícil perceber isto ? Conversando ainda com Issara é possível constatar que ainda tem preconceitos tupiniquins sobre cubano ser fugitivo. Difícil de acreditar e aceitar. Luben e Issara são pessoas muito agradáveis de finíssima educação e de uma inteligência singular. Gente da boa safra do mundo.

Com José Renato e Erika, aprendo o quanto é importante o tempo em que ficamos juntos neste período e independe se faça chuva ou sol. Descubro que férias só tem sentido com eles por perto e muito perto.

    Pergunto, onde seria possível aprender tanto assim ? Férias tornam-se sinônimo de aprendizado e vida. Aliás, abre-se a discussão: as férias deveriam ser uma extensão do trabalho ou o trabalho deveria ser uma extensão das férias ? Férias é uma compensação dos dias mal vividos dentro das organizações?

É difícil responder. Ao pensar um pouco sobre isto e observando o que está ao nosso redor tudo deveria ocorrer como acontece com as crianças. Aproveitam as férias e em determinado momento ficam com saudades da escola. O modelo de trabalho e a forma que as organizações se utilizam para adaptar a realidade do novo capitalismo, onde as margens diminuem sensivelmente e a concorrência aumenta em proporções globais, geram uma pressão desmedida que contribui para que o sentimento de prazer apareça somente e apenas quando se está longe delas. Não deveria ser assim, mas o fato é que as pessoas têm sede de estender este comportamento que aparece nas férias para dentro do local onde trabalham, mas na maioria das vezes não conseguem. Por isto daqui em diante talvez seja importante pensar no que diz Domenico de Masi, sociólogo Italiano em sua colocação sobre o Ócio Criativo, que alia trabalho, estudo e lazer dentro da filosofia de vida. Vale a pena ler um pouco mais sobre isto. Fica a recomendação.

Então quando você estiver de férias e falar isto para alguém e receber a devolutiva de que você é muito folgado ou coisa parecida, desdenhe, pois férias é muito mais do que colocar havaianas nos pés. É a oportunidade de viver, aprender, experimentar a criatividade, compartilhar e poder dizer uma pequena frase feita : "É isto que vamos levar da vida !"

Abraços a Anselmo e esposa, Simone, Ana Beatriz, Ana Luiza, Maurício, Lilo, Lubhen e Issara e filhos, Paulo e a todos que deixaram nossos dias especiais neste janeiro de 2011.