terça-feira, 22 de março de 2011

40 do primeiro tempo.

    Na iminência de adentrar para o seleto time dos que já completaram 40 anos no próximo dia 27 de março, desafio-me a falar um pouco disto nas próximas linhas. O que será que pensa o homem que completará 40 anos ? Ia fazer esta pergunta colocando o artigo indefinido "um" homem, mas seria muita pretensão querer representar toda a classe aqui, visto que cada um pensa de maneira diferente. Tentei entrar na minha cabeça para fazer uma auto-entrevista. Fazendo uma analogia com um jogo de futebol, como o título do texto sugere, quando se chega aos 40 minutos de um primeiro tempo, o jogo está quase acabando e aí os times descerão ao vestiário para recuperar as forças e voltar para o segundo tempo seja para manter ou ampliar o placar quando se está ganhando, ou correr um pouco mais quando se está perdendo. No futebol o placar é formado pelo gol marcado ou sofrido. Na vida, a grande incógnita é saber definir muito bem o que forma o seu placar, inclusive para posteriormente poder saber se você está ganhando, empatando ou perdendo.

    Pensando um pouco mais a respeito, o meu placar é formado por diversos fatores dos quais comecei a fazer uma análise. Cheguei a conclusões e defini o que hoje é muito caro a mim, que eu denomino de elementos essenciais, que são compostos por fatores tais como família, amigos, saúde, espiritualidade e cultura. E nestes termos estou ganhando de goleada.

Família: Talvez seja uma vocação formar uma família. Coloco este item no topo, pois não tem como ser diferente. Tudo passa, o concreto fica, mas sua família te dá àquilo que em nenhum lugar do universo irá conseguir. É este ambiente que lhe proporciona grandes alegrias e grandes tristezas. Minha família é maravilhosa e contém os mesmos elementos que todas as outras: diferenças, abraços, beijos, desentendimentos, solidariedade, falhas, acertos, amor, problemas, decepções, união, apoio, exigências, apego, carinho, consenso, contrassenso, tudo isto tanto para mais quanto para menos em determinadas situações. Isto porque todos são pessoas como eu. Qual família é diferente disto ? O fato é que na essência todo mundo é bom e eu sinto isto quase que fisicamente. Independente dos fatores citados anteriormente estarem no mais ou no menos, amo todos eles.

Amigos: Fato que não posso reclamar. Tenho muitos e aqui desmistifico que qualidade significa redução da quantidade. Neste item, no meu caso, não existe regra de proporção. Tenho diversos amigos, muitos amigos mesmo. Dizem que nas situações de aperto é que saberemos quais são eles. Talvez, mas isto pouco importa agora. O fato é que tenho retirado de todas as pessoas que me cercam belos exemplos de seres humanos. E a gente sente quando as pessoas gostam da gente, que querem o nosso bem. Isto me dá uma energia muito boa na vida, sinal que estou seguindo um bom caminho. É o meu termômetro. Também aprendi que não é uma fagulha de comportamento de qualquer destas pessoas que a destronam do posto de amigos. Queremos as pessoas do jeito ideal para nós e aí o crivo fica afiado para definir quem é ou não passível de ser considerado amigo. É evidente também que existem pessoas muito difíceis de conviver, mas o problema é com elas mesmas, pela rigidez cognitiva em demasia. Mas os amigos são os pilares e para ter ou ser amigo, é preciso apenas abrir o coração. Não pode ter exigência. Muitos dos que não encontro há tempos, dedico ao menos uma oração como um modo de mantê-los por perto. Não me atreveria a escrever o nome de todos estes amigos aqui, visto que não me perdoaria em esquecer algum nome desta minha enorme lista. O fato é que muito provavelmente você que está lendo este texto é uma destas pessoas especiais das quais cito.

Cultura: Deus me presenteou com um dom de apreciar as coisas boas. Independente dos Big brother's ganharem espaços, das músicas ridículas tocarem ininterruptamente nas rádios (o que virou a minha amada Rádio Aparecida é inacreditável), dos programas televisivos cada vez mais ridículos, continuo atraído por coisas boas e não somente para poder bradar aos quatro cantos que não assisto e depois em casa assistir a todos estes programas. Falo com propriedade, pois me considero iluminado por não me interessar por nenhuma destas porcarias citadas anteriormente pelo simples fato de não gostar mesmo. Que sorte a minha. Continuo apreciando o que o homem produz de melhor seja na música, no cinema, na literatura, nas artes em geral. Este ponto é muito importante para a vida. Saber apreciar, pesquisar aquilo que nem sempre é divulgado. Ter aprendido música aguçou esta sensibilidade e como conversava por estes dias com um grande amigo, isto muda o seu jeito de viver, de agir, a meu ver para muito melhor. Saber tirar som da imaginação, de um instrumento, nos torna mais gente, mais forte no lado humano. É uma forte ferramenta para lidar com circunstâncias da vida e um tipo de inteligência das mais importantes, classificada há anos atrás como inteligência emocional.

Espiritual: Acredito que consegui traçar uma linha bem clara sobre razão e espiritualidade. Uma das coisas que adoro é a filosofia. Em minha opinião, existe uma linha limítrofe a respeito da filosofia e da religião. Quem não sabe exatamente onde termina uma e começa a outra, tem grande chance de viver uma vida muito vazia. A religião quando usada sabiamente e quando se consegue entender exatamente qual o seu sentido, abre muitas possibilidades de crescimento como pessoa. A filosofia idem. Como pode o casamento entre filosofia e religião ? Acredito ser perfeitamente viável, desde que se tenha equilíbrio no discernimento das duas coisas. E comigo tem sido assim. Acho que estou encontrando o ponto certo. Quem se radicaliza em um dos dois pontos, torna-se em algum momento vazio, pois as respostas consistem justamente no casamento das duas coisas na minha humilde opinião. A espiritualidade engrandece o homem tanto quanto o conhecimento filosófico.

Saúde: Item fundamental para ter o resto das coisas aí de cima. Não tenho do que reclamar. Até hoje, tudo vai muito bem e sou muito grato a Deus por isto. Quem não tem um problema ou outro ? Mas acho que o tamanho destes problemas torna injustificável a sua narrativa diante do todo.

    O jogo tem caminhado muito bem para o meu lado. O fato é que às vezes outros fatores entram na frente e distorcem tudo isto. É preciso estar com estes indicadores muito claros na nossa cabeça, pois do contrário, a busca frenética pelos dias atuais nos confundem e somos capazes em certos momentos de pensar que a vida não anda boa. Mas é lógico que a vida que chega aos 40 também traz questionamentos e dúvidas.
Tomando um chopp com um amigo que está morando em outro país deparei-me com uma brincadeira feita por ele que também é deste quadro de idade; disse-me "olha rapaz, você já tem mais passado do que futuro !" Devolvi a brincadeira dizendo "Vou enterrar todos vocês, eu prometo !" Silêncio. Troca de olhares e gargalhadas a seguir. Brincamos com o fato de estarmos virando os 40, numa boa, sem trauma. Quando alguém pergunta minha idade, eu respondo sem dor, não tenho crise quanto a isto. O fato é que no futebol onde jogo bola hoje sou o mais velho (ainda dou trabalho para os meninos mais novos); na empresa onde trabalho os meninos mais novos começam a me chamar de senhor. Evidente quando se fala em idade, fazemos uma correlação em algum lugar de nosso inconsciente com a morte por estarmos nos aproximando cada vez mais dela mesmo que ainda esteja distante. Isto permeia o inconsciente coletivo também. Em algum lugar em nossos pensamentos, tem uma ampulheta virada e a areia está caindo. José Saramago brinca em "As intermitências da Morte" retirando a entidade de nossas vidas e é interessante perceber o que acontece, se a vida melhora ou piora. O primeiro ponto é estar bem resolvido quanto a este assunto e o fato é que ninguém consegue por mais que pronuncie que sim. E o homem de 40 anos que sou prefere esquecer isto por enquanto, prometendo retornar a este assunto um pouco mais a frente no tempo, quando estiver melhor resolvido.

    É o homem de 40. Alguns chamam os questionamentos que temos em certa idade como crise de meia idade. Eu mudaria isto, talvez todos nós passamos por uma segunda adolescência. Muito mais do que as transformações físicas (cabelos brancos ou a falta de cabelos de qualquer cor) um homem de quarenta anos enfrenta sim uma nova adolescência, porém, com uma maturidade muito maior para diferenciar exatamente as inquietações que realmente merecem ser pontuadas. Lá na primeira, uma espinha incomoda tanto quanto a dificuldade de se escolher um futuro. Na segunda, o que incomoda são fatores que batem de frente com aquilo que você acredita e que nesta altura da vida está muito claro e consolidado na personalidade. E daí, tal qual fazemos na primeira adolescência, precisamos fazer diversas escolhas, talvez mais duras e necessárias. Talvez segunda adolescência seja mesmo o nome apropriado, pois pensava que todas as dúvidas estariam resolvidas com a maturidade. Que nada, algumas foram resolvidas, outras surgem. Às vezes a gente vive uma situação meio que parecida com Sócrates, o filósofo que tanto nos ensinou: "só sei que nada sei". Tenho esta convicção principalmente depois que vejo que atualmente a pessoa que mais me ensina os conceitos da vida tem apenas oito anos de idade e chama-se José Renato. Só sei que nada sei, ou se preferir, só sei que tenho muito ainda a aprender. Se o que move o ser humano são as perguntas e não as respostas, ainda tenho muito a caminhar. Lembro-me de ter conversado com Dona Raimunda, avó do Lô Borges, quando estava completando seus 100 anos de idade, abordando sobre o segredo desta longevidade e ela me respondeu o seguinte: esqueça logo seus problemas, reze e faça palavras cruzadas. Talvez seja uma boa receita, pois a dona do conselho foi-se embora aos 103 anos, com pequenos problemas comuns do desgaste da carcaça física, mas a mente, completamente saudável.

    Apesar de todas estas dúvidas que ainda vão perdurar por tempos, na trajetória dos 40, começamos a buscar e iniciamos uma compreensão de como queremos marcar nossa passagem por aqui nesta vida, qual a nossa missão aqui nesta passagem e começamos a querer alinhar cada uma de nossas atitudes a esta descoberta. Como seremos lembrados, depende realmente das atitudes do agora. Começo a escrever hoje o meu passado e tomara que ele seja bem escrito, pois muito lá na frente, ele será o livro de cabeceira de todas as noites.

    A todos envolvidos direta ou indiretamente à minha vida nestes 40 anos o meu muito obrigado por tornar minha existência significativa. O blogueiro dá a liberdade de desejar a si mesmo muitos anos de vida e dizer a todos que a vida é maravilhosa. Que ela comece todos os segundos, todos os dias, em qualquer idade. Sou neste momento o maior admirador da frase "A vida começa aos 40".